Hugo Norberto Krug
Algumas considerações iniciais sobre o stress docente
Considerando que este ensaio faz parte do espaço formativo do GEPEF intitulado “Cenas e cenários sobre formação e prática pedagógica de professores de Educação Física”, o mesmo tem como objetivo abordar o stress do professor... de Educação Física.
Neste direcionamento citamos Osiecki (1998) que coloca que em épocas anteriores, durante a pré-história, o homem lutava pela sua sobrevivência. Isto significa que o stress era o da luta pela vida, que necessitava de movimento, ação, dinamismo, adaptação a diversas situações e lugares, neste caso predominava o stress físico. Ao passar do tempo, as necessidades do homem transformaram-se. Com o advento da agricultura e da criação, surgiu o sedentarismo, com o assentamento de várias tribos ou grupos em determinadas regiões. Assim, ocorreu a estabilidade das sociedades e das famílias. Já na sociedade moderna, tudo baseia-se no capital, sendo o trabalho o principal ou um dos maiores valores do ser humano. Isto pode desencadear uma acirrada e estressante concorrência para o trabalhador, pois a maior produção sugere o mais competente. Estes fatos sempre foram fonte de busca e estudo pelos efeitos geradores do stress e suas conseqüências sobre o ser humano. Podemos perceber situações em que os níveis de stress apresentam-se evidentes e suas influências sobre as atividades cotidianas das pessoas mostram-se fundamentais nos seus comportamentos, refletindo, muitas vezes, em situações de desequilíbrio psicológico, emocional e social.
Segundo Naujorks (2002) o professor cada vez mais tem se ressentido em seu cotidiano profissional, pois sentimentos de desilusão, de desencantamento com a profissão são freqüentemente relatados evidenciando o quanto esta profissão está vulnerável ao stress.
Mattos (1994) em seu estudo intitulado "Vida no trabalho e sofrimento mental do professor de Educação Física da escola municipal: implicações em seu desempenho e na vida pessoal" destaca o quanto as atividades pedagógicas dos professores são permeadas por circunstâncias desfavoráveis forçando-os a uma reorganização e improvisação no trabalho prescrito, tornando-lhes o trabalho real totalmente descaracterizado em relação às expectativas. Tal distorção no conteúdo de suas atividades pedagógicas não lhes permitem vivenciar este trabalho como significativo, o que gera um processo de permanente insatisfação. Essa situação os induz a sentimentos de indignidade, fracasso, impotência, culpa, desejo de desistir, entre outros.
Desta forma, com um quadro como o descrito acima, temos como conseqüência um profissional da Educação Física eescolar cada vez mais propenso ao processo de stress, pois são inúmeras as fontes geradoras de stress dos professores.
Mas, para um melhor entendimento desta temática precisamos abordar algumas questões, entre elas as descritas a seguir.
O que é stress?
Conforme Nieman (apud Naujorks, 2002) a palavra stress é definida como qualquer ação ou situação (estressor) que submete uma pessoa a demandas físicas ou psicológicas especiais. Em outras palavras é qualquer coisa que desequilibre.
De acordo com Naujorks (2002) o termo stress, foi introduzido na literatura da área médica por Hans Selye em 1936, e caracteriza uma alteração endocrinológica que se processa no organismo quando este se encontra em situação que requeira dele uma reação mais forte que aquela que corresponde à sua atividade orgânica normal. O Dr. Selye descreveu a Síndrome de Adaptação Geral (SAG), que corresponde ao stress biológico, apresentando-se em três estágios:
1º) Reação de alarme - é quando há liberação de várias substâncias como a adrenalina, o hormônio aldosterona, corticóides como o cortisol e hidrocortisona, entre outros, evidenciando significativa alteração no organismo;
2º) Resistência - ocorre quando a ação do estressor se prolonga exigindo do organismo uma maior adaptação. Todo o processo inicial que desencadeou o alarme vai sendo assimilado pelo organismo e o mesmo vai se adaptando a ação do estressor que, se prolongado, desencadeará outras reações no organismo; e,
3º) Esgotamento - ocorre quando a ação do estressor permanece por um longo período, esgotando a energia de adaptação do organismo. Neste estágio o organismo pode ser atingido tanto no plano psicológico ou emocional, quanto no plano biológico ou físico. Cada indivíduo poderá desenvolver determinados sintomas ou doenças de acordo com seus recursos psicológicos para lidar com a situação ou, também, de acordo com sua contribuição e herança genética.
Tipos de stress
Para Lipp (1996) existem dois tipos de estressores:
1) Internos - são determinados pela própria pessoa, já que revelam, muitas vezes, o seu modo de ser, de se relacionar, as características de sua personalidade. Como exemplos são citados a ansiedade, o negativismo, o pessimismo, a rigidez, a raiva, etc.; e,
2) Externos - caracterizam eventos ou condições externas ao organismo, que o afetam, independente da vontade da pessoa. Como exemplos são citados a falta de infra-estrutura da escola, a indisciplina dos alunos, a indiferença dos pais em relação a vida escolar dos filhos, entre outros.
Com a popularização da palavra stress, Seger (1992), alerta para os maus usos que fazemos do termo, pois, freqüentemente, identificamos stress como estímulo ou como reação e em raras oportunidades é definido como um processo, o que corresponde a sua verdadeira natureza. Argumenta, que, por este motivo, convém utilizarmos o termo "estressor" para designar o agente estimulante ou a situação que está desencadeando a excitação no organismo. A expressão "stress" deve ser utilizada para identificar o processo psicofisiológico em que o organismo se encontra. A expressão "reação de stress" para definir o comportamento que o organismo manifesta, decorrente do processo desenvolvido.
O stress ocupacional
O stress relacionado ao trabalho é definido como aquelas situações em que a pessoa percebe seu ambiente de trabalho como ameaçador. As necessidades de realização pessoal, profissional, saúde física e psicológica, podem ser prejudicadas pelas influências do stress. O desempenho no ambiente de trabalho, pode ser severamente prejudicado, na medida em que este ambiente contenha demandas excessivas a ele, ou que tenha recursos inadequados para enfrentar as situações (França; Rodrigues, 1996).
Segundo o Ministerio de Trabajo y Seguridad Social (1987) stress ocupacional é quando as demandas do meio externo (trabalho), superam as capacidades de enfrentamento do indivíduo. Caracteriza-se pelo "ajuste" inadequado entre a pessoa e o ambiente, tendo-se em mente as necessidades sentidas pela pessoa e suas relações com o meio, o qual oferece fontes de acontecimentos positivos e/ou negativos.
Conforme Osiecki (1998) há um grande volume de estudos sobre o stress ocupacional,e conseqüentemente uma enorme variedade de conceituações. Inicialmente o que pode-se descrever sobre o stress ocupacional, é que as condições do ambiente são muito relevantes.
No stress ocupacional os fatores interpessoais tem um papel muito importante. O trabalho é envolto pelas relações interpessoais, e como argumenta Larocco; House & French (1980), o apoio social em uma empresa moderará o impacto do stress sobre a saúde física e mental. Muitas condições de trabalho tem íntima relação com a causalidade do stress, por exemplo, o trabalho efetivo versus trabalho temporário, cronometragem do tempo e outros fatores organizacionais.
Segundo Guevara Valdes et al. (1997) é menos vulnerável ao stress o sujeito que tem um trabalho que compreenda boas relações interpessoais, onde se compreenda o outro, onde se digam as coisas claramente, com humanidade e companheirismo.
O stress docente
Alves (1997) considera a profissão de professor entre as mais suscetíveis ao stress pela própria natureza do trabalho, onde as pressões são contínuas e as tarefas inadequadas para a realidade em que atua.
Hembling e Gilliland (apud Villa et al., 1988) citam a existência de um ciclo de stress durante o ano letivo, sendo os fins de períodos e o final do ano, as épocas de maiores índices de stress dos professores, devido as tensões acumuladas pelas avaliações.
Gonzalez y Lobato (apud Villa et al., 1988) argumentam que a docência pode ser uma profissão de risco e que pode provocar a neurose, a depressão, o stress e as enfermidades psicossomáticas; e chegam ao entendimento que a personalidade do professor pode ter muito a ver com a predisposição às doenças. A exigência da sociedade e dos próprios alunos descontentes com os métodos de ensino contribuem e incidem para a desvalorização da profissão e também de alguns professores.
Segundo Gatti (1997) a profissão de professor é uma área que tem se tornado menos atrativa, pelas condições de formação, plas condições do trabalho em si e pelas condições salariais.
Pettegrew y Wolf (apud Villa et al., 1988) descrevem três tipos de stress docente:
1) Relacionado às tarefas do professor - podemos citar muitas, desde correção de provas, planejamento de aulas, lançamento de notas entre outros (na maioria das vezes são feitas em casa, no momento em que deveria acontecer o descanso, lazer ou outra atividade não relacionada ao trabalho). Além das tarefas cotidianas de sala de aula, há algumas tarefas fundamentais do educador: a) comunicador - atingir objetivos através de sua comunicação, b) conscientizador - criar a consciência coletiva, consciência de identidade e de classe, e, c) organizador - é necessário transformar a escola em centro para a comunidade, integrando e organizando movimentos que girem em torno da escola e favoreçam a comunidade em geral;
2) Relacionado à função do professor (discrepância entre o ideal e o real) - tendo muitas vezes que se mobilizar totalmente par adaptar-se a novas realidades. Há ainda a fragmentação do trabalho, a dificuldade de fazer face simultaneamente a relação pedagógica e a transmissão de conhecimentos. Existe ainda a função do professor de interrelacionamento com os alunos, estes com suas características e necessidades distintas. Mesmo entre estas oscilações de relacionamentos demasiados íntimos ou demasiados distantes, o professor tem como objetivo propiciar e mediar o conhecimento. Precisa buscar em cada aluno, suas qualidades positivas, a fim de provocar oseu desenvolvimento; e,
3) Relacionado ao stress do próprio trabalho - determinado por fatores como a falta de recursos materiais e físicos, pela dificuldade de interrelacionamento entre os profissionais, pela falta de condições do próprio professor a se adequar a tais situações.
Osiecki (1998) destaca que é imprescindível que o professor reconheça o stress que as tensões e conflitos do meio educacional geram, a fim de preservar seu equilíbrio psicológico.
Algumas considerações finais sobre stress docente
A docência é, segundo alguns autores, uma das profissões que mais causa desgaste emocional e stress. Este trabalho que poderia ser uma fonte de realização pessoal e profissional, torna-se penoso, frustrante e todas as situações novas que poderiam servir como uma motivação, passam a ser uma ameaça temida e, portanto, evitadas. Os mecanismos de defesa psicológica surgem como uma estratégia natural do próprio organismo que se resguarda das adversidades. Quando o indivíduo está "armado" utilizando em sua defesa estes mecanismos, muito pouco de crescimento pode ocorrer e o diálogo é difícil de ser efetivado colocando em risco muitas situações que poderiam se converter em verdadeiras fontes de aprendizagem e trocas para todos (Naujorks, 2002).
Osiecki (1998) em seu estudo intitulado "Stress ocupacional em professores de licenciatura" sugere várias condutas para combater o stress. São elas: a) adoção de um estilo de vida saudável - o estilo de vida é construído a partir da maneira diária de alimentar-se, vestir-se, cuidar-se, relacionar-se com os outros, praticar exercícios ou outro tipo de atividades; b) livrar-se das más tensões - viver sem pressões significa ficar à parte do ciclo natural da vida e isto não é possível, entretanto, em uma sociedade caracterizada pelo excesso de pressões, mantê-las em um nível tolerável é fundamental por isso devemos superar as tristezas e sofrimentos; c) valorizar o autoconhecimento - trata-se algo imprescindível, pois, a partir do momento em que a pessoa conhece as coisas que lhe incomodam, que lhe perturbam, pode evita-las ou enfrenta-las de frente; d) realizar atividades prazerosas - através de atividades prazerosas pode-se isolar e esquecer fatores estressantes; e, f) auxílio a técnicas de relaxamento, musicoterapia ou métodos psicoterapêuticos - independentemente qual for a escolha pelo auxílio, o importante é procurar ajuda, pois são processos que favorecem o autoconhecimento, desenvolvendo estratégias de enfrentamento, estruturando e avaliando as atividades essenciais do cotidiano.
Referências
ALVES, G.L.B. Homem moderno aprende a conviver bem com o estresse. Gazeta do Povo, Curitiba, 10 de agosto de 1997. p. 1-3.
FRANÇA, A.C.L.; RODRIGUES, A.L. Stress e trabalho: guia básico com abordagem psicossomática. São Paulo: Atlas, 1996.
GATTI, B. A formação de professores e carreira: problemas e movimentos de renovação. Campinas: Autores Associados, 1997.
GUEVARA VALDES, J.J. et al. Reflexiones sobre el estrés. Santa Maria : Guevara Valdes, 1997.
LAROCCO, J.M.; HOUSE, J.S.; FRENCH, J.R.P. Social support, occupational and health. Journal of Health and Social Behavior, n.21, p. 202-218, 1980.
LIPP, M. Pesquisa sobre stress no Brasil. São Paulo: Papirus, 1996.
MATTOS, M.G. Vida no trabalho e sofrimento mental do professor de Educação Física da escola municipal: implicações de seu desempenho e na vida pessoal, 1994. Tese (Doutorado) - Instituto de Psicologia / Universidade de São Paulo, São Paulo, 1994.
MINISTERIO DE TRABAJO Y SEGURIDAD SOCIAL. El estrés físico y psicológico en el trabajo. Spaña (Madrid), 1987.
NAUJORKS, M.I. Stress e inclusão: indicadores de stress em professores frente a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais. Cadernos de Educação Especial, Santa Maria, n.20, p.117-125, 2002.
OSIECKI, A.C. Stress ocupacional em professores de licenciatura, 1998. Dissertação (Mestrado em Educação) - Centro de Educação / Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 1998.
SEGER, L. Psicologia e Odontologia - Uma abordagem integradora. Santos: Editora Santos, 1992.
VILLA, A. et al. Perspectivas y problemas de la función docente. Madrid: Notigraf, 1988.
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