quinta-feira, 28 de junho de 2012

O PRECONCEITO RACIAL NA ESCOLA... E NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR

Hugo Norberto Krug

Considerações iniciais a respeito do preconceito racial na escola... e na Educação Física Escolar
        Atualmente estamos vivendo tempos de grandes transformações, onde o ser humano está preocupando-se, cada vez mais, com o seu bem-estar, com a prática esportiva, aliado à valorização do indivíduo como também à busca de uma sociedade mais justa e mais humana.
        A educação e conseqüentemente a escola e o professor possuem um papel importante nesta busca de uma sociedade mais justa e humana. Nesta busca vários obstáculos são enfrentados e entre eles destaca-se o preconceito racial.
        Assim, este ensaio teve como objetivo abordar a questão do preconceito racial na escola... e na Educação Física Escolar, no intuito de criar subsídios para que os professores possam fazer uma reflexão sobre este tema e melhor encaminhar as práticas educativas.
        Entretanto, sabemos que o tema preconceito é muito polêmico onde poucos profissionais o têm abordado, simplesmente por ser algo complicado.
        Segundo Souza (1998) a escola pode amenizar e discutir o preconceito, pois participa diretamente na formação da pessoa, o que é de fundamental importância na construção de um cidadão que saiba respeitar todas as diversidades entre as pessoas.
        Para Guimarães (1997) o preconceito nada mais é que formular conceitos e opiniões antes de conhecer a realidade. O preconceito nasce quando um grupo defende sua identidade como a melhor e a legitima, deixando as outras à margem da sociedade, sem ninguém para defendê-las.

A origem do racismo no Brasil
        Segundo Maia (1976) o preconceito racial não é uma atitude apenas anti-humana, mas, também anti-científica. O preconceito não é uma atitude gratuita, ele existe e estão fixados nas raízes mais profundas, em propósitos muito nítidos, conscientes ou não, de denominação social, econômica ou política.
        Ainda o mesmo autor diz que o racismo no Brasil está presente em todas as camadas sociais, mas parece apresentar uma maior ênfase nas classes superiores. Neste país as pessoas pouco se revelam, ou deixam explícita a sua forma de pensar, já que qualquer atitude anti-racista pode levar a ser preso ou a pagar multas. O que ocorre com freqüência é que as pessoas, habitualmente, os mantêm disfarçado. Por mais que os brasileiros procurem esconder, existe um problema racial em nosso país. O Brasil, nada mais é do que uma grande caldeira, onde se fundem os povos e as raças mais diversas, para o advento futuro do tipo antropológico brasileiro.
        Muitas pessoas acreditam, em tese simplista (senso comum), que temos como descendentes apenas três raças, a branca, a negra e a índia. Mas de acordo com estudos de Maia (1976), este descobriu que somos produto de raças de três continentes: o americano, o europeu e o asiático. Por todas estas raças resultam diversas etnias que existem hoje no Brasil.
        Desta forma, segundo Maia (1976, p.23), o conceito de raça “são populações mais ou menos isoladas que diferem de outras populações da mesma espécie pela freqüência de características hereditárias”.
        Assim, para Souza (1998), o que define uma raça não é a língua falada, a cultura, a tecnologia. O que caracteriza uma raça é a freqüência dos traços genéticos existentes nos seres humanos. Deixando a espécie humana a capacidade de se misturar entre si. Nossa espécie possui uma alta heterogeneidade, sendo o povo brasileiro resultante da subdivisão da população, porque diferem entre si os fatores de caráter genético.
        Silva (1987) comenta que o Brasil, apesar do grande contingente de imigrantes negros africanos, que foram seqüestrados na época da colonização, parece que ainda prevalece o poder e a ordem nas mãos das pessoas de cor branca. Outra questão polêmica é que neste país, onde parece predominar a maioria da raça negra, a cor branca ainda é atestado de boa conduta.
        Segundo Silva (1987) nos anos trinta os intelectuais argumentavam que a mistura das raças branca, índia e negra criaria uma raça inferior.
        Maia (1976) na tentativa de provar que o negro e o índio teriam sido predestinados apenas para o trabalho, que exigia força física, deixa cada vez mais em decadência esta classe, na visão da classe dominante. Parece que para eles, essa classe economicamente inferior não é portadora de inteligência para assumir quaisquer tipos de conquistas, a nível intelectual e político, já que fisionomicamente e congenitamente era inferior.
        De acordo com Silva (1987) essa denominação de raça inferior foi herdada desde a época da colonização, quando surgiu a falsa idéia de que a cor conduziria a maldição de CAM (lenda nascida entre os hebreus, que nela os negros africanos descenderiam de Cam filho de Noé. Cam foi amaldiçoado pelo pai pela sua ineverência e por posturas indecentes) ou no mínimo, o negro seria descendente de uma suposta “maldade congênita”. De que somente a cor branca teria seu papel no campo social, estético, moral, religioso, filosófico e histórico. Uma raça superior, o oposto da raça negra.
        Ainda segundo Silva (1987) a raça negra sempre foi motivo de comentários maldosos entre os povos tais como: sujo, preguiçoso, triste, fétido, feio, temeroso, selvagem, exótico, folclórico, etc. Tudo isto mostra a forma preconceituosa de tratamento em relação ao negro. O autor também cita alguns exemplos da associação de coisas ruins, feita por uma classe dita superior, em relação ao povo negro:
1) Câmbio negro, venda de dólares de maneira ilícita;
2) Ovelha negra, está associada à desobediência e má qualidade nos lares ocidentais, onde a criança que procede “mal”, torna-se ovelha nega;
3) Setembro negro, nome dado a um grupo terrorista palestino, temido por ter assassinado muitos inocentes em setembro de 1977 na Jordânia;
4) Luto, representa sentimento de pesar, tristeza, perda de um ente querido;
5) A noite e o dia, a noite representa trevas, espaço inseguro, hora de dormir. O dia é hora de acordar, é claro, você pode observar as coisas;
6) Deus e diabo, tudo que representa nosso ser supremo é revestido de cores claras e ao diabo é destinado as cores negras;
7) Lista negra, estar fora dos parâmetros normais; e,
8) Negro destino, quando ocorre um trágico acidente.
        Para Azevedo (1975) o processo de mestiçagem em uma sociedade multiracial como o Brasil, apresenta sua distribuição em forma de grupo fechado, onde cada um apresenta características comuns; o dos dominantes, raça dita como superior, e a dos que aceitam ser dominados, a inferior.
        Nesta visão, ainda segundo o mesmo autor, o grupo de menor status sente-se quase incapacitado diante do poder do outro (pequena e poderosa minoria), no sentido político, econômico e social tornando-se assim um grupo submisso e fora dos padrões normais, impostos por uma sociedade dominante.
A mestisagem deixou no Brasil mecanismos de interação social dos grupos e de diferentes raças, mas cada grupo parece apresentar sua própria cultura. Entretanto, com a miscigenação estas culturas estão se heterogeneizando, deixando de ser encarada como algo de ordem estritamente biológico, para vir a ser avaliado como um processo social e cultural (AZEVEDO, 1975).
        O meio para essa mistura de raças, ou para a ascensão social se dá pela forma mais convencional, o casamento multiracial. Essa ascensão é realizada através do casamento entre brancos, negros, índios e amarelos. Esse acesso parece ser uma das pouquíssimas formas de embranquecer a raça, através da genética. Com essa mistura deixa uma maior probabilidade de se gerar filhos, que estejam o mais próximo dos padrões considerados normais pela sociedade preconceituosa e assim possa fugir da descriminação racial brasileira (AZEVEDO, 1975).
        Maia (1976) coloca que o racismo brasileiro, comparado ao de outros países dotados de preconceito, são conseqüências de atividades anti-humanistas e que transmite e reflete em atitudes anti-sociais.
        Destaca ainda que as diferenças de preconceito entre dois países americanos, que participou diretamente da “imigração” africana: Brasil e Estados Unidos. Nos Estados Unidos, o racismo é firmado pelo ódio e é transmitido na agressividade. O Brasil parece ser uma civilização exemplar resolvido pelo mais democrático e implacável processo de miscigenação e amálgama de raças e a causar inveja ao resto dos países dotados de preconceito.
        O racismo do Brasil é um preconceito sem rancores e sem perseguição. O negro brasileiro hoje, apresenta em seu favor uma lei anti-racista, “a Lei Afonso Arinos” que desde 1951 não foi mudada nem revogada. Outra lei é a lei n° 7.716/89, proibindo qualquer tipo de racismo (MAIA, 1976).
        De acordo com Azevedo (1975) o Brasil é o herdeiro de uma tradição lusa da miscigenação. A mestiçagem é arrolada como mecanismos de interação social de indivíduos e grupos de diferentes cores, pela sua função de homogeneidade cultural e de integração social. Relata que o acesso nas classes sociais dominantes, dar-se-á pela integração dos indivíduos da raça negra, nas camadas superiores, a raça branca. Essa união inter-racial faz com que os filhos aproximem mais dos padrões ditos normais para uma sociedade como o Brasil. Pessoas que apresentam a pele mais clara têm um melhor acesso ao mercado de trabalho e apresentam um melhor nível de escolaridade. Para a sociedade vigente as pessoas de pele mais clara têm maior possibilidade de se tornar socialmente branco.
        Para Souza (1998) a população brasileira, realmente está embranquecendo, se continuar essas misturas de raças (miscigenação), muito provável, não existir raça negra daqui a alguns anos no Brasil.
Segundo Guimarães (1977, p.10):

Os mulatos não foram computados na população negra, mas sim na parda, que inclui ainda os cafuzos (mestiços de preto com índios) e mamelucos (filhos de índios e brancos), totalizando 40,11% da população brasileira de 1995.

        Conforme Barros (1996) os meios de comunicação desprezam totalmente o princípio constitucional do respeito aos valores éticos da pessoa humana. Só reafirmam o dia-a-dia de preconceito e racismo, tanto por fatores econômicos ou por preconceito racial.
        Outro ponto polêmico é que segundo Silva (1987), pessoas negras que conseguiram concluir seus estudos universitários com a mesma qualificação que as pessoas brancas, entretanto estas pessoas são consideradas para o mercado, menos qualificadas, somente por ser negra, tornando-se assim sua remuneração inferior a do segmento branco.

A escola e o racismo
        Segundo Barros (1996) parece que o currículo escolar não privilegia aspectos de cultura negra. Inclusive há a grande influência do conteúdo eurocêntrico em nossos currículos. Isto tem determinado a atuação dos professores diferenciando crianças negras e brancas. Há a discrepância de se achar a superioridade biológica branca à negra.
        Maia (1976) coloca que a inteligência não provém da questão racial e sim de fatores genéticos. Mas, porém está sujeito a mudanças, por fatores ambientais durante a gestação ou mesmo após o nascimento. Estes dois fatores genéticos e ambientais estão interligados. Isto mostra que a raça negra sofre preconceito, não é pela questão de ter um QI inferior, mas quem provoca estas diferenças são as condições sociais que são na maioria das vezes mais baixas que as pessoas ditas “brancas”. Também afirma que a inteligência resulta de: a) maturação dos fatores genéticos; b) exercício e a ação sobre o mundo físico; c) imposições sociais de um determinado nível; e, d) equilibração.
        Ainda para Maia (1976) em um país, onde a maioria descende de origem escrava, as pessoas ainda apresentam influências na legitimação de inferioridade dos negros na escola, como também os induz a se sentirem inferiorizados perante os brancos.
        Segundo Guimarães (1997) a discriminação racial nas escolas brasileiras, apesar de inúmeras tentativas de aniquilá-la, se torna cada vez mais difícil, porque o mito da democracia racial, isto é, da igual oportunidade para brancos, negros e mestiços parece não ser do interesse de todos.
        Essa tentativa de igualdade não findada, só não é efetivada “porque os órgãos de orientação das massas e nos entes estatais, nota-se certa recusa em examinar objetivamente o assunto e distribuir-lhe relevância” (AZEVEDO, 1975, p.34).
        Conforme Guimarães (1997) a escola, na maioria das vezes, é a responsável por esta diferenciação, limitando o negro a uma situação e papéis de menor capacidade, podando o seu crescimento e impedindo o seu progresso no âmbito escolar como no campo profissional.
        Há indícios, que em escolas tanto pública como particular, profissionais procuram ocultar a origem da criança negra matriculada, chamando-a de moreninha, parda, quase branca, etc. Com isso acaba tolhendo a criança, não deixando que estas se auto-valorizem ou valorizem sua raça. Tudo isso tolhem sua identidade racial e impedem a valorização positiva de nossa diversidade étnico-racial e o respeito mútuo entre brancos e negros (SOUZA, 1998).

As pesquisas sobre educação indicam que crianças não brancas completam menos anos de estudos que as brancas, mesmo quando se considera da mesma origem social ou renda familiar per capta (MAIO; SANTOS, 1995, p.239).

        A disparidade educacional entre alunos brancos e negros com relação as faixas etárias, varia de idade para idade, mas sempre a raça branca parece apresentar um índice mais elevado na escolaridade. As crianças brancas com a mesma origem social, econômica, que o negro, tendem a permanecer por mais tempo na escola (MAIO; SANTOS, 1995).
        Silva (1987) relata que tanto no âmbito universitário quanto nos outros segmentos escolares, o ingresso está cada vez mais se tornando elitista e seletista.
        O autor destaca que uma pequena porcentagem de negros que conseguem chegar à universidade, ainda se depara com outros problemas. Um deles é o choque de cultura, onde o negro tem que aderir às imposições de uma ideologia cultural dominante e que não conduz nada com a realidade.
        Segundo Nascimento (1978) toda essa disparidade com relação às raças e educação, vão refletir posteriormente no campo do trabalho e na vida dessas pessoas, refletindo numa melhor qualificação no campo profissional. No Brasil, o negro não faz parte dos currículos escolares, estes dão mais ênfase aos países de prestígio, como Europa e Estados Unidos. A cultura afro-brasileira é considerada sem grandes atrativos para a cultura dos dominantes.
        Outro ponto polêmico é que, segundo Silva (1987), dentro do ambiente universitário parece que o negro é visto mais como uma curiosidade no campo da pesquisa do que realmente como interesse no combate ao preconceito. Tais interesses parecem estar relacionados às indumentárias, à religião, às medidas antropométricas, à criminalidade, à composição do sangue, à música do que, na integração social do negro no ambiente escolar.

Considerações finais a respeito do preconceito racial na escola... e na Educação Física Escolar
        Segundo Souza (0918) o preconceito racial existe entre os brasileiros com profundas raízes e é difícil de ser exterminado.
        Entretanto, ao se trabalhar o preconceito nas aulas na escola, acreditamos que amenizaria tal atitude de desrespeito para com a raça negra.
        Percebe-se que a escola participa diretamente na construção do cidadão e nada melhor que ensinar desde cedo a pregar o amor ao próximo, o respeito às diversidades raciais, para que mais tarde no seu dia-a-dia, não tenha que deparar-se com atitudes de desrespeito as pessoas só por serem diferentes das outras. Entendemos que devemos valorizar a capacidade intelectual das pessoas, bem como suas qualificações e não suas origens.
        Em um país multiracial como o Brasil, a nossa cultura teria que se apresentar de forma diversificada. Teriam que falar sobre todas as raças e não com ênfase em uma apenas, a branca.
        O direito dos alunos em conhecer sua cultura deve ser respeitado por todos, sendo negros, brancos e índios. Conhecendo sua própria cultura é possível que se faça um país crescer culturalmente. Começaria a existir respeito entre as raças se assim procedêssemos.

Referências
AZEVEDO, T. de . Democracia racial: ideologia e realidade. Petrópolis: Vozes, 1975.

BARROS, L. Por uma política nacional de combate ao racismo e à desigualdade racial: marcha Zumbi contra o racismo, pela cidadania e a vida. Brasília: Cultura Gráfica e Editora Ltda, 1996.

GUIMARÃES, C. Viva a diferença e abaixo o preconceito. Revista Nova Escola, a.XII, n.108, 1995.

MAIA, N.F. Laboratório racial. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1976.

MAIOo, M.C.; SANTOS, R.V. (Orgs.). Raça, ciência e sociedade. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 1996.

NASCIMENTO, A. do . O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

SILVA, J.M. Democracia à brasileira: raízes históricas. Rio de Janeiro: Thesaurus Editora, 1987.

SOUZA, G.F. de . O preconceito racial / capoeira no âmbito escolar, 1998. Monografia (Especialização) - Faculdade de Educação Física / Universidade de Brasília, Brasília, 1998.

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